quinta-feira, 22 de novembro de 2012

terça-feira, 20 de novembro de 2012

HISTÓRIAS QUE ME ATREVO A CONTAR


                                                                 A MENINA DANÇA?


…Já não se encosta a face à face da dama.
…Já não se trauteia aos ouvidos da donzela.
…Já não aproximam os corpos (a medo) como outrora.
…O rigor da indumentária já não se verifica.
…Os passes de dança já não são motivo de censura por mal praticados.

Recentemente dei nota de uma cena passada no período da adolescência, num dos frequentes bailes, ao fim de semana, no Clube de Sete Rios, cujas antigas instalações ficavam nos arredores do velho Bairro das Furnas.
Pensando melhor e, pela importância que, naquele período, tais eventos representavam para a juventude, entendi desenvolver um modesto apontamento de registo, a fim de, eventualmente, se tirar ilações e, quiçá, compara-lo com os hábitos/costumes contemporâneos.

A cidade de Lisboa, naquele tempo, estava bem apetrechada de clubes recreativos e sociedades culturais. Eram dos poucos espaços democráticos de raiz popular. Designavam-se, de alguma forma, como um movimento de oposição, de resistência cívica, política social e cultural, ao regime fascista.
Pelo seu empenhamento, umas quantas foram encerradas e, alguns dos seus dirigentes passaram pelos calabouços da polícia política e, do regime.

Creio não estar a ser injusto se referir que, a juventude, na maior parte desprovida das acções da política, para além da sua ocupação no trabalho, ou no liceu, “perdia-se” no pensamento, pela chegada das matinés, ao fim-de-semana, organizadas nas colectividades.
Era das poucas oportunidades, nas voltas de um slow ou de um tango, ter nos braços a sua escondida paixão. Ou para o aprazimento, tanto quanto possível, à sua “fogosidade” que, nessa idade, a todos assolava.
Era quase sempre os rapazes os primeiros a chegarem ao bailarico.
Acomodavam-se no bufete.
Por vezes jogavam às moedas ou diziam dichotes. Mas atentos da chegada daquela, por quem o interesse vinha observado ou observara em fim-de-semanas anteriores.
Raramente se sentavam, a não ser que o seu par já o tivesse por comprometido.

As moças vinham sempre acompanhadas das mães. Ou recomendadas pelo “olhito” de uma vizinha. Só excepcionalmente tinham autorização de sozinhas, irem ao salão de baile. Quanto muito em grupo, mas sempre na presença de alguém de “confiança” dos seus pais.
Apresentavam-se de saias e blusas ligeiramente ajustadas ao corpo. Um ou outro colar de pechisbeque ornamentava o peito, escondendo um modesto decote.
Era raro o uso de calças. Aqui ali, alguém com pudicas e ligeiras camadas de batom nos lábios.

Ao fundo do salão de baile, encontrava-se o palco. Nele, quase sempre um conjunto musical.
Junto das paredes, por debaixo de alguns espelhos, ou de fotografias de cor sépia pelo tempo, as filas das cadeiras, onde se sentavam as raparigas e, as suas “vigilantes”.
Quando o animador da sala, dava o sinal aos músicos para iniciaram a actuação, os jovens, aos poucos, sorridentes, uns atrás de outros, sala fora, lá iam no encontro das donzelas.
Apresentavam-se de fato, casaco necessariamente abotoado e gravata a condizer. Com os sapatos era condição trazê-los bem engraxados, para dar nas vistas quando observados nos passos da dança.
Eram momentos de grande nervosidade.

A menina dança?
Aqui a sorte estava ou não na aceitação, na maior parte das vezes, pelo consentimento, por gestos ou sinais, de quem a acompanhava a rapariga.
Registar que, mesmo contra a vontade a quem formulei o convite, levei algumas “tampas”.
Desistir nunca.
Momentos altos, por tão bom, eram quando consentido o encostar do rosto, permitindo (por vezes) cantarolar aos ouvidos da parceira. Quase sempre dava azo a um “apertadinho” mais ousado e, também ao estalo, ou ao abandono, no meio da sala, do cavalheiro. Foi também acontecimento nalgumas vezes.

Interessante era o momento em que, o animador anunciava “damas ao bufete”.
O cavalheiro convidava e obrigava-se a pagar, uma bebida ou um bolo, ao par que, mais “sorte” lhe deu naquela tarde.
Eram também momentos que, o pouco dinheiro nos bolsos desaparecia.
Nem tudo era “mau”.
Nestas ocasiões de “damas ao bufete”, permitia, por breves momentos, ficarmos livres da vigilância da mãe ou do “olhito contratado”.
Aqui os sorrisos, algo comprometedores e, os afagar/encostar os dedos na mão da donzela, eram sinais do interesse para uma maior aproximação e, desejo do namorico.

Mas tudo passa.
Com o surgimento das discotecas, dancigs, pubs, etc., os hábitos de convivência da juventude mudaram muito.
Nos dias de hoje, sobretudo em Lisboa, a importância destas sociedades, como locais de reunião social e cultural, foi decrescendo. Poucas são as que, mantém as raízes. A grande maioria já não funciona. Nas existentes é muito rara a presença da juventude e, ver as “enchentes” como em outrora se verificavam.

Já não se encosta a face à face da dama.
Já não se trauteia aos ouvidos da donzela.
Já não aproximam os corpos (a medo) como outrora.
O rigor da indumentária já não se verifica.
Os passes de dança já não são motivo de censura por mal praticados.
Mas…Sempre que posso, mesmo já no arrastar dos pés, não dispenso uma matine dançante.
A senhora dança?

Fotomontagem da furniana Teresa Carvalho (Té)

domingo, 11 de novembro de 2012

PASSEAR NA MATA S.DOMINGOS DE BENFICA E SENTAR-ME NOS BANCOS FEITOS DE PAU


Este meu apontamento vem a propósito de ver visto uma fotografia, dando-me a observar, um conjunto de bancos corridos, expostos numa vereda, assentes em blocos de pedra, rodeados de farta vegetação, levando-me a pensar e a sussurrar “onde eu já vi isto”.
Tal retrato mostra três assentos feitos de troncos de madeira. Salpicados de rasteiro musgo, certamente originado pelas intempéries dos anos da existência, parecendo-me abandonados de manutenção.
O responsável por esta fotografia, puro furniano, dá pelo nome de Carlos Nunes. A oportunidade de pessoalmente lhe falar ainda não surgiu, temo-lo feito, tão só por flashes nas páginas sociais comummente acessíveis. No entanto suficientes para saber da sua travessia na vida, quer do velho, quer do novo Bairro das Furnas.

Este apaixonado pela arte de fotografar é neto da saudosa Sr.ª D. Delfina, moradora na principal e, mais comprida rua do velho Bairro (Eng.º Gomes de Amorim). Filho da saudosa Sr.ª D. Irene que, fazia parte do efectivo do pessoal do posto da assistência social aos moradores. Mulheres bem conhecidas e, estimadas pelas gentes do meu velho bairro, sendo certo, hoje, adultos, sobretudo da Sr.ª. D. Irene, não esquecem dos dispensados cuidados enquanto crianças. Na minha passagem, estes seus familiares, sempre me cumprimentaram. No meio dos seus simpáticos sorrisos, como ficava contente por ouvir prenunciar …“olá Raul como estás”… Ruborizado, baixava humildemente a cabeça em sinal de respeito.

A vida também é feita de recordações. Este retrato, durante dias, “martelou” constantemente na minha cabeça. Não resistindo à saudade, num recente dia, fui observar de quanto fiel era todo o local envolvente que, a fotografia projectava. O trajecto escolhido, para a “minha” Mata S. Domingos de Benfica, foi pela estrada do acesso ao Calhau. Foi de propósito. Queria “sentir o atravessar” da passagem de nível do comboio, da inexistente Estação da Cruz da Pedra.

Num pulo, alcanço o Palácio Conde de Mascarenhas, demoro uns momentos a observar o abandonado chafariz do antigo Convento de S. Domingos de Benfica, onde ficava, ao tempo do Marcelo Caetano, o chamado Instituto de Reeducação para raparigas, hoje uma instituição religiosa. Paredes meias, a antiga Capela dos Castros (Igreja S. Domingos de Benfica). Pena minha ter as portas fechadas, escondendo o seu belo, direi mesmo, magnifico interior.
A estremar, recentemente desactivado, o Instituto Militar dos Pupilos do Exercito.

Entre modernos caminhos pedonais e pistas para velocípedes, procuro uma estrada para entrar na mata.
Confesso ter sido algo difícil orientar-me até avistar a velha mina.
Subo mais alto.
Por aqui recordo quando em menino imitava os gritos do Tarzan, tal a parecença com a selva traduzida nos filmes projectados no velho Salão de Festas.
Percorro outras estradas, vejo aqui e ali, novos equipamentos dignos do meio ambiental; Parques de Merendas bem equipados, caminhos pedestres, circuitos de manutenção, parques infantis bem apetrechados, locais no meu tempo não existentes!

Procuro a fonte onde enchi vezes sem conta garrafões de pura água da mina e, onde namorei, troquei beijos e, abraços sempre que, as oportunidades surgiam.
Sinto tristeza pelo seu abandono, não tem o brilho de então. Um pouco de tinta branca fazia toda a diferença.
Por perto, imediatamente na vereda abaixo, já não vejo o lago dos patos, onde torci um pé ao saltar, quando vazio, na procura dos peixes retidos num pequeno refugio, mesmo no seu meio. Hoje, em sua substituição, um bonito parque desportivo incorporando um campo de basquetebol e, uma torre de pedra para escalar.

Sigo para o regresso. Encontro o conjunto dos três bancos corridos, assentes em blocos de pedra, rodeados de farta vegetação que, a fotografia ostentava.
Foram momentos de grande nostalgia. Um dia destes vou voltar para novamente me sentar nos bancos feitos de pau e, matar as saudades.


sábado, 10 de novembro de 2012

FUI À MATA MATAR SAUDADES

Um dia destes escrevo sobre este dia. Foi lindo recordar

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

TENHO SAUDADES DE A TER AO MEU COLO


Ficava inquieta ao pressentir a minha chegada na entrada da rua.
Era sempre a primeira, ao meu encontro, quando a casa chegava.
No seu cumprimento não deixava de partilhar algo bem seu.
Entregava nas minhas mãos satisfeita, ora, o seu osso higiénico, ora um dos muitos brinquedos que tinha espalhado pela sala. O seu rabito erguido não cessava de abanar. Depois, corria, desenfreada para o seu canto no sofá da sala, só repousando quando lhe afagava a cabeça e, o seu lindo pêlo encaracolado.

A Kika, que, comigo partilhou os 12 anos da sua vida, estava sempre atenta a todos os movimentos como de um vigilante se tratasse.
Era cruzada. Sua mãe, caniche de pura raça, numa noite “perdida de amores” por um cocker, originou o misto.
Do pai, apenas “herdou” as patas que, eram largas com as unhas bem fortes.
Da mãe todo o demais.
Rafeira pois claro. Mas elegante, com atitude no porte, bonita como de raça pura se apresentasse.
O seu pêlo, de cor branca, "convidava-me" constantemente a acariciá-lo.

Creio não exagerar se disser que, o amor de um cão, ou de uma cadela para com o seu dono é, para toda a vida. Para um cão, ou para uma cadela, nada importa se o seu dono é rico ou pobre, se é desta ou daquela cor e, muito menos a sua condição de vida.
Desde que, o dono lhe retribua respeito pela sua liberdade, formas de estar, atenção e mimos, não sei se é justo dizer que, não há gesto superior no amor, lealdade e respeito. Direi que, o seu amor não se esgota, mesmo, quando por vezes são maltratados por gente de atitude, na grande parte das vezes, desenquadradas no respeito por todo o ser vivo.

A minha “caniche” não veio de França, país onde a raça é oriunda.
Inteligencia não lhe faltava. Enquanto pôde saltar para a minha cama, dormia aos meus pés.
De manhã, bem cedo, para o seu passeio matinal, acordava-me, ora lambendo-me, ora juntando a sua cabeça à minha, procurando saber pela minha respiração se estava ou não acordado.

Era natural Quinta do Conde , Sesimbra, veio para minha casa pela mão da minha filha Catarina, ainda não tinha 4 meses.
Levámo-la umas quantas vezes a visitar a família da menina que, a viu nascer e, quem por ela muito chorou na partida.
Deixávamos também observar os pais da Kika o seu rebento.
Como foram bonitos estes momentos.

Segundo os entendidos, esta raça de cão tem muita apetencia e agilidade na água, curiosamente a minha Kika não gostava de tomar banho.
Também era um martirio quando presentia a ida ao verternário. Termia como varas verdes.
Não imagino o seu sofrimento quando por lá esteve internada, uma semana, por sujeita a uma operação cirurgica para retirar quistos nascidos na barriga.
Morreu muito mais tarde.
O seu coração, as suas pernas, por avanço na idade, já não aguentavam os passeios pelo jardim.
Nunca foi privada de o visitar, por vezes, nos momentos mais criticos, levava-a ao colo .
Nunca deixou de ter a oportunidade de cheirar a relva e, de contribuir com as suas necessidades fisiológicas nos “territorios demarcados” .
Tenho muitas saudades desta minha grande amiga e, de a ter ao meu colo.

Na foto a Kika ao colo do meu neto Luis