NÃO SÓ FLOREJAVAM
AZEITONAS
… Nos seus
troncos, as cigarras vibravam as membranas em dias de sol…
… No Outono as
suas delicadas, vistosas azeitonas, eram bem pretas e brilhantes…
… A rua onde
crescera e certamente morrera, não tinha nome…
… Nas festas
dos santos populares, tinha como companhia ateada fogueira…
… Uma noite, a
linguagem várias vezes se elevou, ignorando-se quem desejava dormir…
… Ou se calam
ou tomam banho antes de sábado…
O velho Bairro era rico em oliveiras. Rara era a rua que não as tinha.
Sendo que, naquela onde mais abundavam tão robustas árvores deram-lhe justamente
o seu nome; rua das Oliveiras. Ficava bem no alto da colina, paredes meias com
a capela. Hoje, não há gente que, não se lembre, do canto das cigarras quando
vibravam as suas membranas em dias de sol. Ou de ver subir às pernadas, a miudagem,
quando um ninho de um qualquer pássaro era avistado.
De todas estas
árvores decenárias, havia uma, que, alguns de nós miúdos, já adolescentes, lhe dispensávamos
particular atenção. Não tanto pela sua altura, a ultrapassar o telhado da casa em
sua cerca. Não tanto pela beleza das flores despontadas na primavera, rodeadas
de folhas verdes acinzentadas na frente, prateadas e brilhantes por detrás. Ou
no Outono as suas delicadas, vistosas azeitonas, bem pretas e brilhantes. Não,
não era por isso. Era, fundamentalmente pelo local onde estava enraizada, porque,
escondia e bem, quem nela se abrigasse.
A rua onde crescera e certamente morrera, não tinha nome, mas não distava
meia dúzia de metros do meio da Rua Eng.º Gomes de Amorim.
Começava na casa do Sr. José, marido da Ti Belmira, pais do Toni e da Cármen,
bem na esquina da Rua das Tílias. A rua, sem nome, de norte para sul, atravessava,
umas quantas outras ruas, na direcção ao lavadouro comunitário, onde perfilavam
muitas das suas “irmãs”.
Esta “vaidosa” oliveira, estava praticamente “colada” à casa onde vivia o
José Macedo, irmão do Valdemar.
No outro lado, avistava-se a porta do quintal da casa do Sr. Raul Caetano
e, da sua mulher a Ti Julieta.
Neste cruzamento, bem no centro, quando nas festas dos santos populares, tinha
como companhia ateada fogueira. A chama, aqui, era a mais brilhante das noites
festivas. Era o fogacho privilegiado das moçoilas. Na oportunidade, alguns
rapazes, disfarçadamente se empoleiravam nos troncos, para melhor verem, quando
saltavam, as pernas das raparigas.
Ou ela não usa
calças/Ou as tem na lavadeira
Dei por isso
ontem à noite/Quando saltava à fogueira
Quantos fugazes beijos, escondidos, a nossa decenária oliveira “observou”.
Quantas animadas cavaqueiras, noite dentro, “ouviu”.
Quantas noites, os rapazes espiou, nas proibidas “jogatinas”.
Quantas vezes, por brejeiras conversas, “ruborizou”.
Dizia-se, em crença popular; quando se viam as raparigas a apanhar um
pezinho com 3 azeitonas pretas do chão, tinham como intenção, o colocar debaixo
do travesseiro da sua cama, na esperança de sonhar com o rapaz que, pretendiam
namorar.
Uma noite, não sei precisar o dia e a hora, mas certamente muito tarde, a
linguagem da rapaziada, no calor da discussão, várias vezes se elevou,
ignorando-se, por perto, quem desejava de dormir.
De repente, eis que, uma voz bem forte, ecoou na noite já alta:
…Basta seus
malandros…Não se pode dormir nesta casa…Eu vos digo…
Assustados, em segundos, num ápice, os calcanhares depressa tocara os
traseiros em fuga.
Era a Ti Julieta, mulher do Sr. Raul Caetano que, se apresentou encolerizada,
na porta do seu quintal, de camisa de dormir e, de balde de zinco na mão, rematando:
…Ou se calam já
e, desandam rapidamente daqui para fora, ou tomam banho antes de sábado…
Podiam ter transplantado esta linda decenária para outro local, a exemplo
do que fizeram com parte das oliveiras que existiam nos “tanques”, presentemente
(pouco estimadas) no mesmo local com o nome de rua Alcina Bastos.
Não desfrutou dessa sorte.
Foto 1 A oliveira em referência
Foto 2 As
oliveiras perfiladas nos “tanques”
Foto 3 O presente
local com parte das oliveiras dos tanques
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