domingo, 16 de fevereiro de 2014

HITÓRIAS DO MEU VELHO BAIRRO DAS FURNAS (XLII)


CONTADAS ÀS MINHAS NETAS

Num recente dia passado, eu e as netas avistamos, na vila onde moramos, equídeos no pastoreio.
…Já andaste de cavalo…? Pergunta-me uma delas.
A outra sem esperar pela minha resposta refere:
…Eu já, por duas ocasiões com o meu pai…!
Concluindo a autora da pergunta:
…Eu montei um pónei, numa exposição agrícola na Praça do Comércio em Lisboa...!
E em uníssono referem as duas;
…E tu? Já andaste…?
E seguidamente perguntam:
…Quando no levas a andar de cavalo…?

Podemos, logo, pela tarde, andar de “cavalo”, como na vossa idade eu andava retorqui!
Interrogadas perguntam:
…Então como…?

 Foi uma tarde bem engraçada não só por ouvirem a história, mas sobretudo por “cavalgarem” como o avô “cavalgara” quando na idade delas.
No velho Bairro das Furnas, lá em casa, havia um modelo de cavalo de baloiço, feito de madeira, bem bonito, mas longe de satisfazer a minha imaginação de bem cavalgar.
Os pés chegavam ao chão, quando pousados no “estribo”, tendo em conta o meu tamanho, ocasionava, os joelhos ficarem em posição incómoda, dificultando o acesso para agarrar o pau no pescoço do cavalo, a servir de “rédeas”.

A minha preferência ia para os “cavalos” feitos de cana, se bem que não fosse fácil adquiri-los. Quando aventurados e conseguido, com os demais parceiros das brincadeiras, ninguém segurava a rapaziada nas correrias, nas chilreadas e nas batalhas desenvolvidas nas ruas do velho bairro.

A pequenada sentia-se feliz, realizada, não só por ultrapassado o ingénuo risco de “roubar” a cana, mas também pelas brincadeiras originadas.
No velho bairro e em seu redor, que me lembre, havia 2 caniçais:
Um deles estava situado ao fundo do terreno dos jardineiros, mesmo na entrada da Rua dos Choupos, paredes meias com o quintal da Amélia-alta.
O outro caniçal estava situado por detrás dos tanques, nos terrenos afectos à oficina do caminho-de-ferro, um pouco antes da serração do mármore.

As canas destes 2 caniçais serviam de suporte às plantações, no caso do terreno dos jardineiros, para apoio das flores e sebes espalhadas no bairro.
Nos terrenos situadas entre o muro do bairro e a linha do caminho-de-ferro, à beira do caneiro, geralmente as canas serviam para suporte dos produtos agrícolas (feijão,etc) que os operários ferroviários cultivavam.
No terreno do bairro, geralmente já noite, para cortar as canas, tinha que ser em momentos livres dos olhares da vizinhança. Cortávamos a cana bem no meio do canavial, para que não se detectasse a falta pelos jardineiros.
No terreno da companhia dos caminhos-de-ferro; um ou dois saltava o muro do caneiro, um outro ficava do lado de dentro para receber o produto “roubado”, mas antes era verificado se nenhum dos operários estava por perto.

A cana era escamada, ficando uma pequena ramagem na ponta a fazer de rabo. Um cordel era atado na parte mais grossa da cana a fazer de rédea. O “cavalo” estava pronto.
O “cavaleiro” ficava equipado quando ostentava, na cabeça, um chapéu de 3 bicos feito de papel de jornal, ou outro papel a jeito. Enfiada na cintura dos calções, ou suportada por um cinto feito de trapo, era visível a espada de pau. A “guerra” vinha a seguir.
Fevereiro 2014

E o Justo disse:
Gostei, como sempre!!
Aprecio a narrativa "ao corrido" típica dos teus textos.
Tiveste a sorte de na meninice viver simultaneamente na cidade e no 
campo, daí esta e outras vivências anteriores, ligadas a esses cenários.
Lembro-me de pelo Natal ver numa drogaria na Rua da Condessa um cavalo 
do género destes mas em madeira, com uma rodinha e uma cabeça de 
cavalo pintada, com duas pegas laterais.
Ainda recordo os brinquedos de lata e até do cheiro das tintas com que 
eram pintados.
Mais uma vez...palminhas ao amigo Raulão.
Abraços

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

HISTÓRIAS DO MEU VELHO BAIRRO DAS FURNAS (XLI)


O ESCULTOR A QUEM DENOMINAVAM DE CANTEIRO

Há muito que queria registar no meu blog, o homem que, eu miúdo, via no seu quintal num banco sentado, dias a fio, sustentando nas suas pernas magras e compridas, pequenas pedras de mármore que, sobre um pano já rasgado e gasto pelo uso, ousava esculpir.
Todo aquele trabalho me fascinava e, fazia confusão. Como era possível não estilhaçar as pedras ao manipular as macetas de variado porte, os ponteiros e os ciséis em ferro de vários tamanhos, quando trabalhava o mármore para lhe dar as primitivas formas.
Como ficava interrogado de ver aquele homem, de cabelos brancos, de mãos bem calejadas, pacientemente a lixar e a lustrar as pequenas peças já esculpidas que, soubera originar.

Bom dia Ti Damião. Era assim o trato por quem chamava o Sr. Gualdino
Bom dia rapaz.
Respondeu ele sem desviar olhar do que estava a fazer.
Está a fazer é um cinzeiro não é?
A sua cabeça fez um sinal de afirmação, retorquindo com um sorriso;
Olha… é uma peça igual, aquela que ofereci à tua irmã como prenda de casamento!
Como era bonito aquele cinzeiro de mármore rosa e branco que um dia se quebrou contra o chão, deixado cair por mim, quando não o soube agarrar ao contemplar a sua lindeza.

O Sr. Gualdino Damião, morava no nº 20 da minha Rua dos Plátanos.
Morreu com 87 anos de idade, no mês de Junho do ano 1964.
Nesta sua casa, habitavam também a sua filha Srª. Dª. Hirondina e a sua bonita neta Mª Helena Damião.
Gente bem amiga da minha mãe. Muito divertidas, sobretudo a Srª Dª. Hirondina que, nas épocas carnavalescas, mascaradas, acompanhadas pela minha mãe, pela Ti Esperança e pela Ilda dos Óculos, todas vizinhas, não deixavam de brincar a bom brincar por aquelas ruas do velho bairro. A estas paródias também não podia fugir, a Ti Hirondina e a filha mascaravam-me, algo que não me agradava lá muito.

A Mª Helena Damião conta mais 7 anos de idade que a minha pessoa. Por volta do ano 1965, após o seu casamento, muda de morada de casa, com o saudoso Eugénio e filho, passando a viver na Quinta do Charquinho, em Benfica.
Passaram 48 anos sem a ver. No entanto este lapso de tempo, não fez esquecer a sua pessoa.
Ir ao encontro da Mª Damião, por razões da reciproca amizade desde menino e moço, recordar aquela família que tanto me estimara e, saber mais do homem cujo trabalho, em miúdo, me deslumbrava era situação a colmatar.

Naquele dia de inverno, a chuva e o vento forte, não impediu de ir ao seu encontro. Em sua casa, observámos e comentámos fotografias antigas, também menos antigas, recordando gentes da nossa rua, da sua vida e, da vida dos descendentes.
Recorda com saudade o seu marido, companheiro da sua vida. Relembra sua mãe e, o avô. Sem rebuço, afirma ter sido o seu verdadeiro pai.
Fala orgulhosamente do seu filho e da sua bonita neta.
Deparo que os seus 75 anos de idade não lhe tiram a vivacidade do olhar e o sorriso de outrora. A sua voz é inconfundível para quem a conheceu menina e moça.
Na fotografia do seu casamento, comenta a amizade vivida com as moças vizinhas da sua casa. Eramos como verdadeiras irmãs, comenta.

No dia 26 de Dezembro de 2013, a noite aproxima-se. O objectivo do nosso programado encontro também se dá por finalizado, não sem antes perguntar:
…Diz-me Raul, como tens passado? Tens filhos? Netos?
A tua irmã?
E já na despedida comenta:
Olha…se vais escrever sobre o meu avô, não te esqueças de referir que o brasão que existe no quartel dos Bombeiros Sapadores de Lisboa, em S. Bento, foi ele que o fez sozinho, como um verdadeiro escultor que era. Notícia que não saiu do meu pensamento, até ao dia em que teria a possibilidade de ver e fotografar a escultura da autoria do Ti Damião.

Fiquei triste e surpreendido quando me foi recusado retractar o brasão, ali tão perto, pelo oficial de dia ao quartel.
…O Sr não pode fotografar o que pede, sem a autorização do nosso comandante… Concluído:
…Peça-lhe por escrito, garanto que a resposta será rápida…
Defacto; foi rápida e concedida!

Janeiro de 2014 
Raul P Sinos

fotos:
A 1ª foto retracta o Sr. Gualdino Damião.
A 2ª foto retracta a Srª Dª. Maria Helena Damião nos dias de hoje.
A 3ª foto retracta o dia do casamento da Mª Damião, acompanhada pelas damas d’Onor e vizinhas

A 4ª foto retracta a bonita escultura feita pelo Sr. Gualdino Damião, exposta no quartel BSL – S. Bento


E o Bisneto disse:

Olá Raul!
 O trabalho que me envias-te sobre o meu bisavô está admirável.
 Invade-me a nostalgia e a saudade dele, do nosso velho Bairro e da nossa velha Rua.
 Aproveito também para te agradecer os teus trabalhos sobre o nosso saudoso Bairro, com textos e imagens que nos transportam no tempo para junto das pessoas e dos lugares que muito marcaram a nossa infância e juventude.

Tinha 17 anos a quando do falecimento do meu bisavô. Estava então na Força Aérea e em aulas na Base Aérea 2 quando o diretor de curso, o major Tomás, interrompeu a aula e me comunicou o seu falecimento, providenciando o meu transporte para casa.
 Tenho ainda gravada a sua imagem no seu leito de morte.
 São muitas as recordações daquele homem bom e da bisavó Chica (Francisca), sua companheira de sempre.
 Esculpiu muitas obras para jazigos no cemitério do Alto de S.João; são obras que não identifico mas todos ao trabalhos ali existentes são admiráveis e regozijo-me com orgulho, quando tenho oportunidade de os contemplar,por saber que as suas macetas e escopros cinzelaram muitas daquelas obras.

Oh Aida!... (a minha mãe) vou com o miúdo ao café. Lá me levava pela mão ate à leitaria do Sr. Mane´l e do Sr.. António, único local onde nas redondezas existia televisão, recém chegada a Portugal. Quase sempre à noite, após o jantar, lá íamos ver televisão; ele bebia a sua bica acompanhada do seu bagaço e... Oh António trás aí um pacote de bolachas de baunilha aqui para o rapaz! - Regressava-mos a casa quase sempre no fim da emissão após um dos seus  programas favoritos, a volta a Portugal em bicicleta.

Aqui fica expresso o meu agradecimento por me facultares a possibilidade de, como já disse antes, me transportares aos anos do que considero uma saudosa época da minha vida.
Recebe um grande abraço, até breve!

Luís Filipe Ramos (Luís Damião)

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

HISTÓRIAS DO MEU VELHO BAIRRO DAS FURNAS (XL)


A PAIXÃO PELO ARCO E GANCHETA

 Era, quando nos recados à padaria da praça do velho bairro, sobretudo nas manhãs, bem cedo, antes de me dirigir à escola, uma das ocasiões mais desejável, para me “transportar” de arco e gancheta.
 
Andar de arco de gancheta naquelas ruas, não era de todo fácil. O asfalto existente era pobre, irregular, as covas eram mais que muitas.
A minha rua dos Plátanos e, o arruamento de ligação às outras ruas paralelas e, de acesso à saída do bairro, tinham uma ligeira inclinação. Mais acentuada ao confinar com largo onde o mercado se encontrava.
Dizer que este handicap/inclinado originava a velocidade do “transporte” a “dois” tempos. Primeiro em passo de corrida, mas chegado à rampa, aqui o passo era de caracol. Contudo, mais difícil era na descida, tendo em conta a velocidade e os pinotes do arco que, a gancheta e o condutor, mal conseguiam segurar.

O meu arco era aproveitado de um velho aro de bicicleta, originando nas correrias, por mais largo e pesado, dificuldades no manejar. Os arcos dos outros miúdos eram mais leves e finos, eram feitos de ferro, alguns até de aço, mais fáceis de os fazer rodar e manejar. Não tinha serralheiros metalúrgicos na família para me brindarem com um destes bólides, desvantagem jamais desmotivadora das entusiásticas corridinhas, ruas abaixo, na direcção aos “tanques”.

“Tanques” era o nome dado ao lavadouro comunitário, situado a sul dos arruamentos, paredes meias com a linha do caminho-de-ferro.
A rapaziada, aqui chegada, após aturadas correrias, matava a sede com a água sempre fresca que, brotava das torneiras livres de serventia. Seguia-se o molhar das mãos e da cara para que suor e, o avermelhado depressa deixasse de incomodar.

Preventivamente, entre as oliveiras existentes, eramos observados pelas vizinhas na lavagem a roupa. Uma ou outra, de voz bem elevada e ameaçadora, possuindo, nas mãos, algo bem encharcado, “convidavam-nos” a desandarmos “dali-pra-fora”, numa atitude de salvaguardar as roupas lavadas, nos arames estendidas e, a corar no chão sobre as ervas e chorões, para que, não viessem a ser emporcalhadas, no toca e foge, resultante de uma discussão da cachopada, mais acesa, na ultimação das sempre difíceis classificações, para os lugares cimeiros das corridas “ciclo-pedestal” acabadas de realizar.

Hoje, dificilmente se vê um miúdo a andar de arco e gancheta. Talvez num qualquer velho bairro ainda existente, numa das colinas desta Lisboa.

Dezembro de 2013
Raul Pica Sinos

Notas:
1ª Foto do Blog Recordar, Aprender e Descobrir

2ª Foto da C.M.L.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

O 7º ANIVERSÁRIO DA LARA PICA SINOS TEIXEIRA

Na casa da mãe em Pinhal novo ano de 2013




quarta-feira, 30 de outubro de 2013

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

HISTÓRIAS DO MEU VELHO BAIRRO DAS FURNAS (XXXIX)


 OS JOVENS DO RITMO NA CONQUISTA DO ROCK AND ROL


O Beirão, na adolescência, era um “puto” giríssimo. As borbulhas na cara, por via da barba a surgir, não lhe tirava a graciosidade.

O Zeca, era, um galã. Vestia primorosamente, quase sempre de fato, oferecendo elevada elegância.

Os Jovens do Ritmo, durante 8/9 anos, abrilhantaram musicalmente decerto a mais famosa sala de baile de Lisboa. Espelho D’Agua, em Belém,


Esta nova história do velho Bairro das Furnas, vem a propósito por observação das minhas duas netas, quando num dia, difícil de precisar, as transportei no automóvel e, sintonizo no rádio uma das estações que, reproduzem música e canções anos 60/70.

Do banco de trás oiço dizer …Lá vem música dos cotas.!
A discussão foi acesa para catalogar da preferência do melhor:
Digo eu …Será a gritaria, a falta de harmonia no ritmo musical, o aumento dos decibéis de estoirar ouvidos, destes novos conjuntos que esgotam estádios, as danças com esquemas, é disto que vocês gostam?  
Do banco detrás oiço dizer…Não te enerves, transfere lá essa “cena” para um posto de rádio de jeito, porque, a hora de dormir ainda não chegou! (diz-me uma delas elas com a concordância da outra).
Pois foi. Foi esta troca de “ideias” que, se fez luz na memória, os momentos, sobretudo aos sábados, quando colocava umas moedinhas na máquina jukebox, existente no café do Gonçalves, na meia-laranja, ouvindo, repetidamente, as canções então na “berra”; do Elvis Peslay, do Paul Anka, do Littie Richard, entre outros. Muitas das vezes já aperaltado para participar numa sessão dançante, ao som das músicas do rock and roll ou românticas, abrilhantada pela banda Os Jovens do Ritmo!

Creio que haverá, felizmente, ainda muita gente recordada de ver o Beirão a tocar guitarra eléctrica e, o saudoso Zeca acompanhando-o cantando.
Este duo foi um sucesso nas salas de baile das colectividades de Lisboa, ao divulgar músicas e canções de origem anglo/americanas e, italianas.
Mais tarde, por exigência do êxito e dos muitos fãs que, a miude os acompanhava, verificou-se da necessidade de evoluir, passando o duo a quarteto.
Para aqueles que desconhecem tal feito e, decerto modo, para ficar registadas algumas modestas memórias, direi:

José Domingos A. Beirão, o Beirão como lhe chamavam. Na adolescência, era um “puto” muito giro. As borbulhas na cara, por via da barba a surgir, não lhe tirava a graciosidade. Irreverente, como os demais. Uma “fera” a jogar matraquilhos na tasca do carvoeiro situada ao fundo da Rua de S. Domingos, esquina com a Estrada de Benfica.

Adorava o rock and rol, a rebeldia musical, os blusões de cabedal pretos. O fascínio, o encanto pela música, o som das guitarras eléctricas, infernizava-o diariamente.
Seu pai, acompanha-o no sonho e, oferece-lhe uma guitarra electrica de marca Eko, de fabrico italiano, com 6 cordas, com amplificador e barra para vibração, a sua cor era de um vermelho garrido. Custou 18 contos, quiçá vinte vezes superior ao ordenado mensal de um operário.
Vaidoso, era vê-lo depois, não poucas vezes, no quintal do Cataré, a produzir os primeiros acordes.

O José Alberto, o Zeca para família e amigos, era um rapazola alto, de cabelo preto e sempre bem penteado. Vestia primorosamente, quase sempre de fato. Os sapatos sempre engraxados. Indumentária, no seu conjunto, oferecendo elevada elegância. Era o que se pode chamar…um galã. Amigo do seu amigo. Gostava muito de brincar e de cantar todo o género de canções entusiasmantes à época, incluindo mornas de Cabo Verde. Cantava primorosamente bem, com timbre voz limpo e agradável.

Já se referiu o êxito e o entusiasmo destes dois amigos. Queriam mais. Ultrapassados alguns obstáculos, formam uma banda de quarteto, com a junção de um baterista e de um viola de acompanhamento, rapazolas oriundos de um bairro lá para os lados da Pontinha.

Os Jovens do Ritmo, não eram uma banda de menos importância. Em Setembro de 1965, na 7ª eliminatória do concurso Ié-Ié, no destruído Teatro Monumental, ao Saldanha, há quem defenda que, não ficou em 1º lugar, porque o vencedor (Gatos Pretos) era apadrinhado pelo dono do teatro o Sr. Vasco Morgado (pai).
A prova do seu esmero trabalho não demora a chegar, são convidados a participar no filme (Estrada da Vida), durante um mês, em Angola, com o artista Tony de Matos.
Durante 8/9 anos de brilhante carreira, mensalmente, são contratados para actuarem (ao sábado) no Espelho D’Agua, em Belém, engalanando musicalmente decerto a mais famosa sala de baile de Lisboa.

“Os Jovens do Ritmo” há muito que são uma recordação. Não fazia qualquer sentido continuar a abrilhantar as salas de baile de Lisboa, por respeito, à ausência daquele que foi decerto o seu grande animador.

O Beirão morava na Rua Eng.º Gomes de Amorim. A rua principal do bairro como ele lhe chama.
Após cumprido o serviço militar, foi ocupar, com a família, uma nova casa na Quinta das Pedralvas, em Benfica.
Mecânico de profissão. Em parceria com o Santana detém uma oficina auto na Rua do Montepio Geral, em S. Domingos de Benfica.
Desfeita a sociedade vai viver para a Nazaré. O Sr. Domingos como é conhecido por lá permanece durante 18 anos.
Hoje, com 70 anos de idade, reside no Concelho de Alcobaça, mais propriamente na localidade de Alpedriz.

O saudoso Zeca morava no Bairro Padre Cruz, era namorado da bonita Bina. Depois de casado, com esta irmã do saudoso Zé Augusto, passa a residir na Rua de São Domingos, paredes meias com o Bairro.
Foi funcionário superior da Olivetti e mais tarde concecionário dos mesmos produtos de comercialização.
Foi o responsável, durante alguns anos, pelo Departamento do hóquei em patins do Sport Lisboa e Benfica.
Faleceu aos 40 anos no dia do aniversário da sua mulher.

Agosto 2013


segunda-feira, 24 de junho de 2013

HISTÓRIAS DO MEU VELHO BAIRRO DAS FURNAS (XXXVIII)

 
...
… Partimos com as mochilas e as tendas de lona de cor branco sujo às costas!
… Juramos vencer a distância daquele afloramento rochoso que, distava entre 100 a 150 metros, da praia!
… Já chorava, fiquei assustado de medo, de morrer afogado,

Há mar e mar… à ir e voltar

A frase é da autoria do poeta Alexandre O’Neill, criada para uma campanha contra o afogamento nas praias portuguesas nos anos 80. Vem a propósito para relembrar a atitude de um amigo de longa data que, perante o nervosismo acompanhado com o desmedido bracejar, soube, ter a calma e a lucidez necessárias para que, os dois (eu e ele) ultrapassássemos a forte corrente da fria água do nosso oceano.

A história data ao ano de 1957 e, começa uns dias antes do verão, numa casa localizada no lado direito da entrada do velho Bairro.
A casa ora referida, tinha na sua frontaria a praça, suportava as salas de estudo dos rapazes e das raparigas para complemento pós-escolar, assim como também as salas da Mocidade Portuguesa (extra-escolar).

A acção extra-escolar da Mocidade Portuguesa, ao contrário do que acontecia nos períodos escolares, as frequências apresentavam-se livres. Resumiam-se, sobretudo aos fins-de-semana, com passeios à praia e ao campo. De quando em quando, promovia visitas a sessões de ginástica e jogos desportivos.
Durante a semana, nem todos os dias, nos finais das tardes e por vezes às noites, realizavam-se entre os miúdos, alguns campeonatos de jogos de sala, tais como os jogos de damas e xadrez, entre outros.

Diga-se, em abono da verdade que, uma maioria dos pais tecia em surdina, grandes críticas políticas à sua existência. Proibiam os seus filhos das frequências lúdicas ou de qualquer tipo de encontro naquele pavilhão. Não tanto pelo que faziam, mas sobretudo por aquilo que o organização representava.
Interessante era também verificar as censuras dos responsáveis pela Acção Social do velho Bairro. Chegavam mesmo a afirmar:

 …os dirigentes são incompetentes, pois cultivavam o elemento físico em detrimento do moral, desviando, por esta via, os rapazes e as raparigas das aulas de formação moral e, da missa… (in no Livro o Nosso Bairro)

À parte das críticas e oposições convém dizer que, MP (extra-escolar), não tinha dificuldade em captar o interesse da rapaziada. Brincávamos, jogávamos e, de tempos a tempos, sempre tínhamos a oportunidade de darmos uns passeiozinhos de borla. É num desses passeios que hoje, este meu amigo, felizmente vivo, reformado caldeireiro de profissão, vai ser relembrado, e agradecido com aquele abraço.

Não sei precisar quantos de nós carregando nas costas as mochilas e as tendas de lona de cor branco sujo, partiu no caminho da Serra da Arrábida.
Lá chegados, bem no alto, alegres, todos se dedicaram a montar os seus acampamentos. A paisagem era maravilhosa e todos (os que sabiam nadar) faziam promessas e apostas de bravura para chegar a Pedra da Anicha, mesmo ali na nossa frente.
A inquietação por via da ventania serrana, deixou de ser preocupação. Todos desejávamos que, a noite fosse pequena, mas não foi. Depressa aprendemos a importância das estacas, das espias e, dos cordéis de segurança do equipamento, quando um vento mais forte, levou algumas tendas ravina abaixo, travadas apenas pelas águas do oceano já na praia do Portinho.

Mas o pior susto estava para chegar! Manhã cedo, eu e o meu companheiro, tocador de gaita-de-beiços por uma boa parte da noite, olhamos um para o outro e juramos vencer a distância daquele afloramento rochoso que, distava entre 100 a 150 metros, da praia e que dá pelo nome, Pedra da Anicha.

Num ápice nos deitamos à água e, não levou muito tempo para pisar o solo da citada pedra, então repleta de algas e de outras plantas marinhas. Escalamos a rocha um pouco, levantamos os braços em jeito de vitória para os demais companheiros nos verem. O que não contávamos, ao regressar, foi com a forte corrente existente, pois nem com todas as forças no nadar a conseguimos ultrapassar.
As forças começavam-me a faltar, já chorava, fiquei assustado de medo, de morrer afogado, quando lúcido e calmo o nosso jubilado caldeireiro disse:

…Raul, deixa-te levar pela corrente, verás que chagaremos à praia…

Há mar e mar… à ir e voltar

Julho de 2013

Foto: Fotoconde